Andre Zanki Cordenonsi, autor gaúcho de fantasia e aventura, nasceu em 1975 em Santa Maria, Rio Grande do Sul, onde mora com a mulher, dois filhos, dois cachorros e um terreno cheio de insetos estranhos e seres imaginários. É autor de ficção, com mais de uma dezena de contos já publicados. Publicou seu primeiro romance, Duncan Garibaldi e a Ordem dos Bandeirantes, pela Editora Underworld. O segundo romance, o steampunk de aventura Le Chevalier e a Exposição Universal, foi publicado pela AVEC Editora.
Andre é professor universitário há quase vinte anos, atuando nas áreas de computação e tecnologia. Ele escreve sobre o que lhe passa na cabeça e não o deixa dormir à noite, quando as ideias se derramam no teclado como um trem descarrilado. Apaixonado por tecnologia antiga, divide seu tempo entre ser pai, marido, professor e escritor. Mais em azcordenonsi.com.br
Vamos falar um pouco de seu livro mais recente. De onde surgiu a ideia de escrever uma história que se passa na Paris de 1867? Vamos conhecer mais sobre Napoleão nessa trama?
Na verdade, a inspiração para esta história surgiu quando eu assisti o Fantasma da Ópera, na Broadway. Eu já conhecia a história, mas ver ela ao vivo, encenada num dos grandes teatros, foi uma experiência única. Os personagens me cativaram e eu percebi que o nosso amigo phantom era alguém que poderia ser explorado em vários contextos. Quando retornei ao Brasil, a ideia de escrever algo com esta temática me perseguiu por algum tempo. Reli a obra de Gaston Leroux e, percebi, no entanto, que para contar a história que gostaria seria interessante que os personagens fossem previamente conhecidos. O leitor deveria estar familiarizado com os meus personagens para que eu pudesse escrever algo no contexto do Fantasma da Ópera.
A partir daí, comecei a estabelecer uma história antecessora. Escolhi o ano de 1867 por causa da Exposição Universal, que ocorreu em Paris, naquele ano. Como a minha ideia era construir o protagonista como uma espécie de agente secreto, a presença da Exposição – que atraiu visitantes e expositores dos quatro cantos do mundo – formava o caldeirão de interesses e tramas que serviam perfeitamente ao tema. Afinal, nada pior para quem cuida da segurança de um país do que ter milhares de estrangeiros desembarcando em seus portos. E é exatamente no burlesco, no invulgar, que buscamos nossas inspirações.
Outra questão importante foi a ambientação da trama: por definição, queria escrever um romance steampunk, um gênero que me agradava e que achava que casaria perfeitamente com a trama. Logo, o livro também pode ser classificado como história alternativa. No meu mundo, Júlio Verne é o principal cientista do Império Francês e Abraham Lincoln anda em uma cadeira de rodas, fruto de um atentado fracassado. Mas o imperador da França é Napoleão Bonaparte III, um personagem real (Napoleão I morreu em 1821 e Napoleão II só reinou por um mês, em 1815).
Quais foram suas principais fontes de pesquisa para ambientar o enredo em lugar tão geografica e historicamente distante?
Eu recriei uma Paris para os meus personagens. Apesar de ter buscado informações em diversos livros e sites, principalmente obras de referência e costumes, eu estava trabalhando em uma cidade profundamente modificada pelo progresso da tecnologia retrofuturista. Desta forma, decidi me liberar das garras da história oficial e brinquei com as possibilidades. A minha Paris sofreu um grande terremoto em 1829, criando inúmeros canais pelo desabamento das famosas catacumbas. Desta forma, temos uma cidade onde as embarcações são mais importantes que as carruagens. Por outro lado, o steampunk é um gênero que tem suas influências na moda, no comportamento e na estética vitoriana. Mas é, por definição, um gênero de ficção especulativa. Ou seja, a influência é apenas o ponto de partida. A partir daí, cada escritor desenvolve o seu próprio ambiente steampunk. Se as referências foram a Paris da época, na verdade o livro não retrata a verdadeira Paris, mas o meu mundo em particular.
Tem alguma obra em específico, ou situação que lhe provocou criativamente, e despertou a ideia de colocar esses seres mecanicamente animados na história, os drozdes, como espécie de animais de estimação?
Os autômatos são uma constante no gênero steampunk. Dificilmente você encontrará alguma noveleta ou romance retrofuturista que não flerte, pelo menos, com a robótica relojoeira. Quando estava pensando a estrutura do romance, sabia que gostaria de ter algum tipo de autômato. No entanto, queria fugir da estética da ficção-científica, com seus robôs humanoides e extremamente independentes. O que via a minha mente era algo parecido com os daemons, da série Fronteiras do Universo – Phillip Pullman. Então, misturei este conceito com um material que utilizava em sala de aula, na disciplina de introdução à computação: os autômatos de Pierre Jaquet-Droz, um relojoeiro suíço que vivia em Paris, onde desenvolveu e construiu bonecos animados e animais mecânicos. Surgia, assim, os drozdes, pequenos autômatos movidos a corda, mas imbuídos de um cristal de quartzo que definia e modificava o seu comportamento, tornando-os uma espécie de animal robótico, extremamente fieis ao seu amo.
Quais autores do gênero fantástico, e de steampunk, você mais gosta?
No Brasil, os autores steampunk que leio com frequência são Enéias Tavares, Nikelen Witter, Flávio Medeiros Júnior e José Roberto Vieira. No exterior, tenho acompanhado os trabalhos de Scott Westerfeld, Philip Reeve e G.D. Falksen.
E de outros gêneros?
Os autores brasileiros que costumo ler são Felipe Castilho, Eric Novello, Duda Falcão, César Alcazar, Simone Sauressig e Christopher Kastensmidt. No exterior, o espanhol Manel Loureiro, o americano Andrew Lane, os britânicos Joseph Delaney, Bernard Cornwell e Neil Gaiman, o irlandês Eoin Colfer, além de vários autores clássicos. De todos os gêneros.
Você já publicou em diversas antologias. Como é o processo de criar em cima de um briefing entregue pela editora? É mais fácil desenvolver uma história a partir de uma ideia lançada, com algumas restrições?
Depende muito. Normalmente, as antologias são abertas para submissões. Neste caso, eu só envio um conto se tenho uma ideia bem definida sobre o que escrever. Às vezes, a inspiração surge na hora, às vezes, demora um tanto. Uma coisa interessante sobre as antologias é a possibilidade de você ler várias histórias de um determinado tema, sob diferentes pontos de vista. Acho isso enriquecedor, tanto para o autor, quanto para o leitor. Não sei se é mais fácil, mas é um exercício interessante. E escrever uma história com um limite de páginas ensina você a arte da concisão. Manter o foco na história é um mantra que todo o aspirante a escritor deveria repetir algumas vezes por dia.
Como foi o processo de publicação de seus livros?
O meu primeiro romance levou cerca de dois anos para ser concluído. Como foi a minha primeira obra de fôlego, cometi todos os erros e percalços que um autor iniciante deve cometer. A experiência para os próximos dois romances – que devem sair nos próximos anos – foi tão ou mais enriquecedora do que a publicação em si. Em relação a editora, utilizei o método “normal”: escolhi algumas editoras que trabalhavam com o tipo de livro que tinha escrito, após uma busca intensiva nos seus catálogos, e enviei o meu trabalho. Cada editora tem uma forma diferente de fazer a seleção. No meu caso, algumas semanas após ter enviado o trabalho, travamos contato e fechamos o negócio. Mas isso muda de editora para editora, logo, não pode ser considerado uma regra. O principal é: mantenha o foco, mantenha-se calmo e confie no seu trabalho. Se não acontecer, revise o original. De novo. E mais uma vez. Certifique-se que é o melhor possível antes de enviar para a editora. E não desanime em receber um não. Ele o ensinará mais do que uma pilha de sims.