Noan Moraes, 26 anos, é um estudante de Letras que talvez tenha lido quadrinhos demais na infância e que vê o mesmo filme repetidas vezes até decorar todos os detalhes. Sente a necessidade de explorar e expressar a falta de sentido de sua vida de todos os jeitos possíveis. A mais satisfatória é a escrita.
Orion-z3n parece ter inspirações na FC clássica, principalmente pelos cyberpunks, mas há algo de pós-moderno, com as quebras temporais e metalinguagem. Qual a fagulha inicial para escrevê-lo?
Eu tava lendo muito Phillip K. Dick na época e Blade Runner é meu filme preferido, então queria escrever algo nesse estilo, um futuro distópico esquisito onde a definição do que é ser humano fica meio borrada. A parada das emoções serem consumíveis como se fossem drogas surgiu do que eu tava passando no momento, tinha acabado de começar a tomar antidepressivos e estabilizadores de humor e o texto surgiu da sensação estranha de tomar essas coisas. Você fica mais “feliz”, mas é algo completamente artificial, é uma felicidade opressora muito estranha. Pensei num mundo que todo mundo usasse isso não só para sentir coisas boas, mas para sentir qualquer coisa que seja. A metalinguagem faz parte do que eu sempre gosto de botar nas coisas que eu escrevo, acho que dá vida e personalidade ao texto.
Uma das coisas que mais gostei em seu texto foi esse consumo de emoções, uma ideia não muito nova, mas muito bem executada. O que pode nos abrir sobre o cenário de Orion-z3n? Há outros contos planejados para esse universo?
Muito obrigado, fico muito feliz. Então, tem mais uns três textos nesse universo, que eu chamo de “Filtros”, mas cada um numa época diferente. Acho que o mais futurista é o 0rion-zen mesmo, os outros são mais próximos do nosso cotidiano. O primeiro deles virou um curta-metragem produzido por uma amiga minha que estuda cinema em recife. Eu curti bastante a adaptação dela.
O seu texto faz um paralelo interessante com o episódio "Nosedive", de Black Mirror, principalmente quando a namorada diz "Não posso ser vista com um 85%". Pela data que recebemos o conto, não acho que o tenha visto antes. O que acha dessas curiosas coincidências?
O texto é de 2013, mas é uma ideia já bastante trabalhada na ficção científica mesmo, como tu disseste. E eu não tinha reparado, lembra bastante a ideia desse episódio. A minha intenção no conto era fazer uma analogia com gente disfuncional, pessoas com transtornos psicológicos e a relação delas com pessoas “normais”. E os 100% acabam simbolizando a futilidade e a vaidade. Sou muito fã de Black Mirror e só de alguém fazer ligação com algo que eu escrevi já é uma satisfação absurda.
De onde geralmente começam os seus textos? Você desenvolve a partir de uma ideia central, de um personagem, de um enredo…?
Normalmente as ideias brotam na minha cabeça a partir de coisas que acontecem na vida, coisas que eu leio, cenas de filmes ou músicas que tenham algo marcante, algo que eu possa usar na literatura. Absorvo tanto quanto possível da situação e deixo a ideia envelhecer na cabeça. As que eu não esqueço acabam virando contos. Mas na maioria das vezes eu penso no final primeiro e escrevo dele para trás, até chegar ao começo.
Quais as suas principais inspirações literárias? Você contou que talvez tenha lido quadrinhos demais. Conte pra gente alguns!
Bom, minha mãe é psicóloga e meu pai é professor universitário então o que não faltou na minha vida foi livro pra ler, de tudo que é tipo. Eles sempre estimularam muito a expressão artística em geral, minha e do meu irmão. Os alunos do meu pai sempre emprestavam quadrinhos de todo o tipo pra ele, então com uns 8 anos eu lia Constantine e Sandman, além de Turma da Mônica, X-men e Batman. Mas de literatura mesmo minhas principais influências são o Daniel Galera, Isaac Asimov, Ursula K. LeGuin, Paulo Leminski, Phillip K. Dick, Charles Bukowski, Murilo Rubião, H.P. Lovecraft, William Blake e Neil Gaiman.
O que pode contar sobre projetos futuros? No que tem trabalhado?
Estou tentando escrever dois romances no momento. Na verdade uma novela e um romance. Um romance de formação inspirado no "Apanhador no Campo de Centeio" do Salinger, sobre não conseguir se posicionar no mundo, não saber o que fazer da vida, não se identificar com nada por completo, não ter vontade de lutar por nada e também sobre ser borderline, uma condição psicológica muito grave. A novela é zoando o gênero de fantasia capa e espada, um pastiche de Tolkien e Robert E. Howard com um orc de protagonista que não é o herói ou o escolhido, o mais belo e mais nobre, mas sim o oposto disso tudo.
Para quem gostou do seu texto, como encontrá-lo?
A maioria dos textos eu publico no blog nadavemamente.wordpress.com