Jana P. Bianchi é leitora, escoteira, viajante, escritora, colaboradora do Clube de Autores de Fantasia e, nas horas (não) vagas, engenheira de processos industriais. Publicou a novela Lobo de Rua em 2014. Desde então, vive metade do tempo em Paulínia (SP) e a outra metade na Galeria Creta, estabelecimento dos submundos de São Paulo onde a realização de qualquer desejo está sempre em estoque.
O seu conto “Analogia” tem várias referências à mitologia, esse é um assunto que você explora em outras obras?
Eu curto muito mitologia, acho que é quase impossível não usar de alguma maneira quando escrevemos fantasia. Mas ela não é um ponto central em nenhum outro projeto meu em andamento — não uma mitologia específica, pelo menos. Acho que acabei envolvendo justamente um pouquinho de mitologia nórdica no conto porque morei na Dinamarca e os sítios arqueológicos vikings são sensacionais, impossível não se inspirar. :)
Como surgiu a ideia desse conto? Ele tem alguma relação com seus outros trabalhos?
Em 2014, resolvi criar uma página no Facebook na qual postaria contos de fantasia diários, com tema surpresa baseado no doodle do Google do dia (o desenho temático que aparece na página de pesquisa). Então eu abria a página do doodle de manhã, passava o dia pensando no tema, escrevia quando chegava do trabalho e postava o conto. Com dez dias de funcionamento, vi que seria impossível postar um conto por dia (óbvio, haha), mas resolvi manter os contos nas datas especiais porque gostei da experiência de ter que criar um conto do nada em menos de 24 horas. A versão original de “Analogia” foi escrito no dia 12 de Outubro, com o tema “dia das crianças”. Gostava dos temas mais vagos, porque podia viajar (tinha dia que o tema era tipo “aniversário de independência da Indonésia”, e aí era um tanto mais restrito hehe). Tive a ideia da premissa no carro, dirigindo de volta pra casa: “e se um brinquedo pudesse refletir os sentimentos e o humor de uma criança?”
Falando em outros trabalhos, você tem uma novela publicada na Amazon, entre outras coisas. Nos fale um pouco sobre esse material.
Lobo de Rua é minha primeira publicação, a única até o momento. Nasceu como e-book na Amazon e depois ganhou versão impressa, independente. Conta a história de Raul, um menino de rua paulistano que se descobre lobisomem de repente. No universo da novela, a licantropia é uma doença sexualmente transmissível, então a contaminação é silenciosa e a descoberta da maldição é repentina e inexplicável. Assim, Raul não faz a menor ideia do que está acontecendo com ele até ser acolhido por Tito, um velho imigrante italiano que também é lobisomem. Além de explicar a maldição pro menino e dar umas dicas de como se manter vivo na cidade, Tito também leva Raul até a Galeria Creta, um lugar onde — entre muitas coisas doidas — lobisomens que estejam por São Paulo podem passar a lua cheia em paz. Sempre conversava desse meu projeto com os outros escritores do Clube de Autores de Fantasia, mas ainda não tinha nada escrito nesse universo para mostrar como exemplo. Então resolvi escrever essa novela para introduzir o universo, e de quebra inseri um trecho que serve de prequela do romance em que trabalhava.
A Galeria Creta é um estabelecimento sobrenatural nos submundos da capital paulista onde a realização de todos os desejos está sempre à venda. Quem gerencia o lugar é Minotauro, um demônio com corpo de gente e cabeça de boi. Fazendo a ponte com a primeira pergunta, a forma do demônio e o nome do estabelecimento labiríntico que ele comanda são referências claras à mitologia grega, embora o Minotauro não seja exatamente “um minotauro” e não haja mais nenhuma semelhança com a história do labirinto de Teseu. Atualmente, estou trabalhando no romance que citei antes, que conta a história de um jornalista que é levado à Galeria Creta por conta de um talento cobiçado por Minotauro.
O conto tem uma referência muito interessante à série “A Torre Negra”, de Stephen King. Qual sua relação com o autor e quais suas demais influências?
Eu adoro Stephen King, é um dos meus autores preferidos. Li muita coisa dele — contos, novelas e romances de horror, fantasia, suspense, sci-fi — e acho incrível como ele é prolífico, criativo e competente. E, dentro da obra dele, a série da Torre Negra é especial pra mim. Não sei explicar, mas a atmosfera da série é incrível e os personagens são apaixonantes, além de ter sido a primeira coisa que li dele. Não estava planejado colocar nenhuma referência no conto, mas quando comecei a descrever a visão infantil do meu protagonista sobre o terreno baldio, lembrei na hora do Jake Chambers e da rosa. Como a própria série da Torre Negra é cheia de referências e easter eggs, achei que seria legal fazer uma pequena homenagem. Além do King, Neil Gaiman, Patrick Rothfuss e Haruki Murakami também são influências, embora não tenham nada a ver um com o outro. E entre os autores brasileiros, gosto muito da fantasia urbana do Eric Novello e admiro o André Vianco por ter colocado vampiros em Osasco quando todo mundo achava a ideia estúpida. Hehe…
O final de “Analogia” é muito bonito e singelo. Ele já nasceu dessa forma ou você o descobriu enquanto escrevia? Nos fale um pouco sobre seu processo criativo.
A ideia geral do fim veio junto com a ideia para a premissa, enquanto dirigia pra casa. Todo o resto nasceu enquanto eu escrevia, sempre tendo em mente essa proposta de final. Hoje sei que esse não é o jeito de criar que mais funciona pra mim. Comecei a usar outlines pra planejar meus textos e adorei. O nível de detalhamento desse “roteiro” varia muito com a ideia, com o objetivo do texto e com a sua extensão, mas sempre sei pelo menos o começo, alguns pontos principais do meio e uma ou mais alternativas de fim. Acho que pensar na história antes de começar a escrever me ajuda a produzir mais rápido e a manter a empolgação – larguei muitos projetos porque chegava em algum conflito que não tinha previsto e acabava perdendo o ritmo. Nos últimos meses terminei o outline do romance da Galeria (que foi repensado depois que lancei Lobo de Rua), e quero ver se ter algo estruturado me ajuda também em obras maiores.
Você faz parte do CAF, o Clube de Autores de Fantasia. Nos conte um pouco sobre o clube e seu envolvimento com ele.
Entrei no CAF no início de 2015, quando ainda éramos pouco mais de 300 membros em uma comunidade bem pequena e tranquila. Tinha procurado outros grupos no Facebook pra discutir sobre escrita de fantasia e encontrava só dois tipos de ambiente: ou grupos hostis, onde eu acabava ficando com vergonha de postar minhas dúvidas ou ponto de vista, com medo de alguma resposta grossa, ou páginas que já haviam se corrompido em divulgações impessoais de projetos dos membros. O CAF era o completo inverso: o pessoal era gente boa e havia mais espaço pra conversar do que pra se auto-divulgar.
O Lucas Amaral, criador do Clube, viu que eu participava bastante e me chamou pra ser uma das moderadoras. Hoje temos quase 1.900 membros e o clima de camaradagem ainda é o mesmo. Com o crescimento da página surgiram projetos paralelos como o site, uma revista, uma antologia e tantas outras coisas que ainda queremos colocar em prática em breve.
Além de ajudar a fazer contato com gente do meio editorial (editores, autores já publicados e bem estabelecidos, ilustradores, quadrinistas), minha participação no CAF também me colocou em contato com outros autores iniciantes como eu — alguns até acabaram virando grandes amigos, que encontro regularmente. Novos membros são muito bem-vindos, basta pedir pra entrar lá no grupo (Clube de Autores de Fantasia). :-)
Quais os meios para que os leitores conheçam mais sobre você e sua obra?
A Galeria Creta tem uma página no Facebook (fb.com/galeriacreta). Lá falo mais sobre esse projeto, mas acabo concentrando também outras atualizações e publicações sobre a escrita, em geral.
Quem quiser saber mais sobre o Lobo de Rua, pode procurar as opiniões do pessoal na própria Amazon ( amazon.com.br/Lobo-Rua-Janayna-Pin-ebook/dp/B00YOHKGWM).
No Goodreads (goodreads.com/book/show/26145371-lobo-de-rua)
Ou no Skoob (skoob.com.br/lobo-de-rua-511344ed530433.html).
O Minotauro tem também um e-mail (galeriacreta@gmail.com) para o qual você pode escrever se quiser conversar sobre a Galeria, se quiser comprar a versão física do Lobo de Rua ou também se quiser vender a alma em algum pacto. :-)